sábado, 29 de maio de 2010

It's high time to...

Resolvi re-publicar duas coisas importantes que coloquei aqui no final de 2008. Tudo isso porque existe um momento de turn point, daqueles que simplismente não dá mais para voltar atrás e tentar se acomodar nos velhos lugares. Tudo tem de ser novo, re-feito. Porque os velhos lugares simplismente não servem mais, e permanecer neles é uma violência, que exige, para caber nesses lugares antigos, que vc ceife seus desejos e sua criatividade. E isso dói muito. Não permancer também dói, e dói mais que muito, porque exige criar um novo local de paragem, de ancoragem, re-descobrir onde vc cabe, como, de que jeito... E o ser humano não gosta muito de mudança.

A pergunta que fica é, qual dor vc escolhe?

A de ficar ou a de sair?

Fe Lopes - it's high time to...

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Sobre o reconhecimento do intolerável

Quarta-feira, 22 de Outubro de 2008





"Minha nega me pediu um vestido



Novo e colorido



Pra comemorar



Eu disse: Finja que não está descalça



Dance alguma valsa



Quero ser seu par



E ao meu amigo que não vê mais graça



Todo ano que passa



Só lhe faz chorar



Eu disse: Homem, tenha seu orgulho



Não faça barulho



O rei não vai gostar"



                                                                                             (Chico Buarque - Ano Novo)



Quando comecei a grafitar, bolei um stencil que dizia



"O que você tem feito de você mesmo?"



Logo em seguida me veio a idéia de um bonequinho * bem tôsco, de cabeça baixa e tristonho e ele acompanhava o tal stencil. Logo quando acabei meu painel na Lapa saquei que queria que o meu bonequino dissesse também outra coisa:

Não finja que não é intolerável



Eu queria que ele dissesse isso. Ele, na verdade, quando perguntava "O que você tem feito de você mesmo?", queria principalmente lembrar daquilo que aparece como algo intolerável na nossa vida e que fingimos não perceber, toleramos. Muitas vezes, inclusive, investimos. Muitas vezes investimos no intolerável.



O intolerável se fez muito presente na minha vida muitas vezes. Acho que é assim com todo mundo. Mas a sensação de que era preciso parar de fingir que ele não existia só se fez gritante no começo deste ano. Eu já escrevi sobre isso aqui: um trabalho, uma coordenação intolerável, abusos, rompimento de contratos, humilhações, situações violentas em todos os sentidos.



Demissão. Foi preciso assumir o intolerável e denunciá-lo.



Acho que é sobre isso que queria falar aqui, hoje. Na realidade, é óbvio, sei que estou precisando relembrar em mim que é preciso parar de fingir que não é intolerável e denunciar. Acontece que denunciar o intolerável implica romper situações, relações, assumir riscos e construir outros caminhos. Muitas e muitas vezes toleramos o intolerável pelo medo do que virá depois da denúncia, o que perderemos, a que desconhecido teríamos que nos abrir após deixar de tolerar.



O intolerável não tem a ver com algo moralmente colocado como inaceitável. Não tem a ver com regras determinadas que são rompidas. O intolerável se mostra no corpo, nos efeitos que tem sobre o corpo. Cada um sabe o que lhe é intolerável porque seu corpo lhe diz, seu corpo sente. Sente a despotência que o intolerável lhe causa, o tremor, a sensação de desfalecimento, o entristecimento. O intolerável é a simulação de um campo de concentração da vontade e da alegria: as mata aos poucos.



Um dia postei uma aula de Deleuze sobre Espinosa aqui no blog e, nela, Deleuze dizia que a alegria é inteligente e nos faz inteligentes. Outro dia estava com uma sensação muito boa e de repente me dei conta que se tratava exatamente disso: depois de tanto buscar entender o que me faz alegre, o que me potencializa e, ao entender, poder ir buscar por experiências que vão neste caminho, é muito mais fácil pra mim perceber rapidamente o que me entristece e agir no sentido de dizer "não! é intolerável!!".

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segunda-feira, 29 de dezembro de 2008



Como são e a hora certa by Tati Bernardi

"Enquanto arrumo minha mala para viajar percebo que tenho um novo mantra. Talvez algo aprendido pra trás ou uma espécie de filosofia pra frente. Ainda não sei se tem aí algo de mágico ou apenas um espírito brega de final de ano, daqueles bem otimistas e tal. As calças e vestidos estão enormes pra mim, que emagreci muito esse ano, quero ficar chateada, mas penso que as coisas são como são. Daqui a pouco engordo de novo. Na hora certa. Tenho saudades dele. Uma chaminha de reter quer voltar. Um gelinho de doer quer voltar. Mas solto, deixo, vai, apago, derreto. As coisas são como são. Além do que, uma vida pela frente vai me dizer. Na hora certa. E então meu I-pod toca Led Zeppelin no último volume e eu me acabo de gritar e sentir a vida. Quem diria. Anos e anos ouvindo todos os namorados me xingarem porque eu simplesmente odiava essa banda e agora, do nada, esse amor, essa obsessão. Descobri o cara. E meu Deus como eu amo ele. Pelado, louco, com a voz de um anjo tarado. As coisas são como são. Na hora certa. E então olho o meu “Grande Sertão” completamente riscado e eu obcecada pelas citações. E quem diria. Quem diria. Ontem mesmo, conversando com vários amigos, eles me disseram que eu não mais parecia comigo. Eu pareço eu sim, mas vou ganhando o mundo quando abro algumas brechas da minha prisão. E de brecha, vou me ganhando também. E quase vira o estômago mas sou tomada por uma fome boa que eu nem sei o nome. Talvez acreditar assim, sem medo, em algo descontrolado e de alguma forma justo, seja acreditar em Deus. Durmo em paz. Tudo na hora certa. As coisas são como são. E quando recebo suas mensagens de texto, ao longe, dizendo meio que genericamente que deseja tudo de bom e sente saudade, fico com vontade de perguntar se aquele recado chegou só pra mim ou foi disparado para toda lista do celular. Mas me recolho. Uma minúscula e ainda baixa “vozinha” me diz que além dos meus textos eu tenho também muitos charmes, graças e belezas. Além dos meus espinhos eu tenho também muitas flores. E que sim, eu posso ser amada. Porque não ter alguém agora, agarrado aos meus pés, não significa não ser um calo persistente até mesmo em solas curtidas e acostumadas com a corrida. Descubro coisas terríveis e maravilhosas a respeito do amor. As coisas são como são. E na hora certa. Como diria Milan Kundera “o amor começa por uma metáfora. Ou melhor: o amor começa no instante em que uma mulher se inscreve com uma palavra em nossa memória poética”. Como diria João Guimarães “o que é doideira às vezes pode ser a razão mais certa e de mais juízo”. Como diria ou gritaria ou uivaria Robert Plant “Com apenas uma palavra ela consegue o que veio buscar.
 E ela está comprando uma escadaria para o paraíso”. As coisas são como são. Na hora certa. E foda-se."

Um comentário:

Jú Pacheco disse...

De luas, desatino e aguaceiro
Todas as noite que não foram tuas
Amigos e meninos de ternura

Intocado meu rosto-pensamento
Intocado meu corpo e tão mais triste
Sempre à procura do teu corpo exato.

Livra-me de ti. Que eu resconstrua
Meus pequenos amores. A ciência
De me deixar amar
Sem amargura. E que me deêm

A enorme incoerência
De desamar, amando. E te lembrando
- Fazedor de desgosto -
Que eu te esqueça.
"Júbilo, memória, noviciado da paixão" - Hilda Hilst