domingo, 19 de julho de 2009

Filho da Puta

[Eu ia sair, num devir da vida pratica.... Mas resolvi tomar mais um cha e escrever.]
Filho-da-Puta!
Foi a ultima palavra que ela disse, olhando para o telefone. Ele nao ouviu. Telefone nao eh telepatia. Tem que discar pra ouvir. E ela nao ia discar. Ele nao ia ligar. Era um acordo, que ficava claro com o passar dos dias.
Filho da puta. Ela pensou. Comecou a rabiscar qualquer coisa em um pedaco de papel. Parecia que ia mandar uma carta. Um email. Sei la. Mas o que dizer?
Ela estava enfurecida, tomada de odio. Mentira. Ja nao estava mais com tata raiva. Estava triste. Mentira tambem. Ja nao estava mais tao triste. Estava sim era inconformada, preocupada, culpada e todos os adas perversos que assombram mulheres como ela.
Ela o conheceu num bar de playboy da vila olimpia. Ela nao costuma levar seus tenis coloridos para estes lugares, mas era um festa de aniversario, entao por que nao? Foi e ele estava la, com seu jeans da diesel, num canto tomando um whisky com gelo, rindo com os amigos. Saca aqueles playboys descolados? Era ele, um tipo que chama atencao aonde quer que va. Um tipo que sabe que chama atencao aonde quer que va. Um tipo perigoso, diriam. Ela, bom ela estava la, com um dos seus tenis coloridos. E ela nao era um tipo que um tipo daqueles olharia, sabe? Mas acontece que, nao sei se era solsticio de verao ou qualquer outra raridade dessas, ele olhou pra ela. Olhou, olhou, olhou. Olhou mais. E olhou tanto, que ate ela notou. Notou, se envaideceu, ficou timida e quis fugir. Tarde demais, ele ja estava ao lado dela. Ele, seu jeans da diesel e seu whisky caro. E ela ali, com mais um copo de chopp e seu tenis colorido. E ele era ainda mais ele de perto.
E sairam dali e pensaram que nao daria tempo de chegarem ao apartamento chique dele, aonde transaram loucamente ate o dia amanhecer. E nenhum deles virou abobora. Nem ela gata borralheira. Mas ele tinha toda a vocacao para ser aquele cara do cavalo branco que a gente vive dizendo que nao quer, que nao existe, mas morre de vontade de conhecer.
E no dia seguinte o telefone tocou, e no outro dia tambem. E foi assim por uns meses. E parecia mesmo que os tenis coloridos e o jeans da diesel faziam um par perfeito, deliciosamente amarrotados, jogados pelos cantos do quarto chique do apartamento chique dele.
Ate que um dia o telefone nao tocou mais.
Assim, sem mais nem menos.
Nao tocou.
No primeiro dia ela respirou fundo e disse a si mesma que era normal.
No segundo dia ela voltou a respirar fundo. 18 vezes. E isto nao era nada normal.
No terceiro dia ela pegou seu livro do Dostoievisk e comecou a ler, displicentemente, como se nao esperasse nada. E nada mesmo aconteceu.
No quarto dia, ela ligou. Puta. E a gravacao informava que aquele numero nao exisitia. Ligou no outro numero, e so falou com a caixa postal. Estava irada. Morrendo de saudades.
No quinto dia ela pensou em suicidio. Pensou em largar tudo e se mudar para a Nova Zelandia, comecar tudo novo la. Ela nao estava mais puta. Estava triste.
No sexto dia ela beijou um outro rapaz. E tudo lhe pareceu vago. Vago. Um lugar vago.
Uma semana depois, ela ja nao estava mais triste, nem brava, nem nada. Estava inconformada, sem compreender o que tinha se passado. Desde o inicio, ela diria. Que aparicao mais bizarra esta na minha vida, ela dizia. Se perguntava se havia sido real. Se ela era real. Fala serio, que cara mais maluco, ela falava enquanto tomava o 3 copo de cerveja e dizia que o mundo estava perdido. Eu ria dela, mas ela me ignorava e continuava a dizer que o mundo estava perdido, que mal tinha ligar e dizer que nao queria mais? Sera que o cara havia morrido, sumido no mundo? Nada, nada! Nao sabia nada, ela dizia. Sabe, ela disse e continou "nao era uma questao de querer ou nao querer a mim, era uma questao basica de educacao. De lembrar que tinha uma outra pessoa ali, sabe? Nao precisava se importar comigo, tinha que importar com o contrato social. Educacao basica. Mas o mundo esta perdido. E ninguem mais tem mae em casa pra ensinar a ter boas maneiras e educacao. Ligar depois eh uma questao de boas maneiras. Eu tenho boas maneiras. Mas ele nao tem. Ele nao devia ter mae. Entao posso chamar ele de filho da puta sem peso na consciencia de estar envolvendo uma inocente na historia. Eh isto, ele eh um filho da puta, mas sem puta pra ensinar a ele que ate na putaria a gente tem q ter educacao". Eu ria, e pedia mais uma cerveja, enquanto ela descorria seu inconformismo.
E filho da puta, olhando para o telefone, foi a ultima coisa que ela disse sobre ele.
Foi a ultima coisa e ali ela o enterrou, junto com seu maldito jeans da diesel e seu whisky ridiculo. Cavou os 7 palmos e jogou ali tambem os cavalos brancos que cagavam por todo o apartamento dela. Aff... Fim. Morto. Sepultado. Cuspio e disse com a boca cheia um fo-da-se filho-da-puta, daqueles que a gente fala com gosto quando o time dos outros faz gol. E dai enterrou mesmo. Com direito a velorio, caixao e tudo mais. E entao amassou aquele papel em que rabisca qualquer coisa imbecil e saiu andando calmamente, sem olhar para tras, trajando seus tenis coloridos mais coloridos. Pq estes, estes eram dela. E como eram. Dela. Ela. E isto, ninguem tirava.
F.L. - pq ela, ela eh dela!

quinta-feira, 16 de julho de 2009

Noticias do Analista Marinheiro

Encontrei Analista Marinheiro na padaria hoje. No cair da noite, devorava um pedaco oleoso de pizza de balcao. Falei oi, me sentei ao lado dele e passamos a vida em dia. Como esta vc, como estou eu e bla bla bla. Conversamos sobre a Sereia. E ele, num misto de tristeza, raiva, frustracao e alivio me disse que ela havia sumido ja faziam algumas semanas. Enquanto bebia minha terceira xicara de cafe, ouvia Analista Marinheiro contar sua historia. Dos percalcos, da ternura, da paixao de transferencial avassaladora e dos afestos que as diferentes transferencias vao mobilizando no decorrer dos tratamentos. E entao falou da inseguranca. Daquela coisa que ele diz sempre, sobre a fragilidade de sua identidade de analista de consultorio particular. Identidade que ele sente que por muitas vezes so esta dada e assegurada exclusivamente na relacao especular com este outro-paciente. Falou. Falou. Falou um pouco mais.
Quando ele respirou, colocando o ponto final na historia, eu falei aquilo que somente amigos de verdade podem dizer. Talvez a combinacao de Sereia e Marinheiro, neste momento da vida, nao funcione mesmo, eu disse. E tudo bem. Analista Marinheiro nao deixou de ser mais ou menos Analista por isto. Pelo contrario ate. Mas talvez nao seja o caso de Sereia ser paciente de Marinheiro. Nao agora. E ponto. Ainda eh algo para pensar, mas algo para pensar mesmo. E enquanto ele tomava mais um gole de qualquer coisa gelada, ouvia atento minhas palavras. E segui lembrando a ele dos demais pacientes, dos que ainda viriam, dos que ainda iriam embora, do ir-e-vir, de novas Sereias... e desta violencia transferencial que ele vive e vivera em menor grau, ou maior com outros pacientes. Talvez Sereia tenha vindo para mostrar que todo este movimento se passa em todos os outros atendimentos. Mas que talvez passasse batido. Sereia colocou isto em primeirissimo plano. [e penso que eh ai que esta todo o poder transformador na identidade de Analista Marinheiro]
Pensei que ele se chatearia, se defenderia e que acharia que eu o estava substimando, colocando-o para baixo. Mas nao. Na abertura que somente amigos de verdade conseguem ter, ele ouviu. Atento. E segue pensando...
F.L. - ai, ai...

terça-feira, 14 de julho de 2009

Me cansa a mim

Eu aprecio o silencio. O silencio do nada. Nada mesmo. Sem barulho. Sem corpo. Sem nada. Quando parece que meu corpo se desmaterializa e ate eu mesma deixo de existir. Por alguns segundos. Nao por muito tempo. So o nada. O nada que eu curto aos domingos qdo acordo e ele ainda esta dormindo. Entao me levanto, abro as cortinas - pq deteste cortinas-deprimidas-fechadas - pego uma caneca com suco, faco um queijo quente e me estiro no sofa, devorando o jornal, a revista da folha. Sozinha, em silencio. Sem pressao de hora, compromisso, almoco. Um momento nada. Nem sei se estou ali mesmo. Um momento inteiramente nada. Interamente meu. Interamente cheio. Um nada, mas um nada muito cheio.

Eu acho que coisas demais sao intrusivas e tudo que eh intrusivo me cansa. Barulho demais. Estampa demais. Todos os excessos me cansam. Ate carinho demais. Me invade. Nao sei viver de outro jeito. Preciso, desesperdamente dos meus momentos nada. Nao sao exatamente os excessos q me cansam. Me cansa a mim. Pq nos excessos eu sempre tenho que ser eu por mais tempo, e me sobra pouco tempo pra mim. Nao tem aquele tempo pra nao ser nada, sabe? Aquele tempo nada, do vazio cheio que disse ai em cima. O tempo da bolha, lembra? Ja falei dele aqui. O tempo bolha, o respiro necessario para voltar a ser. Pra voltar. Pra ser.

Eu admiro o silencio. Eh isto.

F.L. - si-len-ci-o

quarta-feira, 1 de julho de 2009

by Ju Pacheco

Resolvi publicar este texto, que a Ju postou no blog dela! E olha que a gente nem fez 30 anos, hein...! Imagina qdo fizer?!
"Sexta-feira, 19 de Junho de 2009

Aos 30 nós somos mto melhores!!
by Ju Pacheco

Domingo é meu aniversário e eu farei 27 anos. No trabalho costumo ser a mais novinha, os usuários me acham criança demais e os outros profissionais ficam espantados com a minha idade. Mas, sinceramente, na vida em geral eu me sinto bem velha! rs... No entanto acho que é bom explicar melhor: não bem velha no sentido negativo!! Eu me sinto bem velha num sentido comum. Me sinto vivida, madura, com muitas experiências. As vezes, inclusive, converso com uma pessoa de muito mais idade, me identifico e me encanto. Sou encantada pelos mais velhos. Tinha um amor e admiração sem fim pelos meus avós, pela Gi (minha terceira avó) e outro dia até disse para meu namorado que tinha vontade logo de ser velha, de ser avó. Que achava que deveria ser um momento muito bom da vida. Eu e a Mõ (amiga! velha amiga!) sempre brincamos que não vemos a hora de sermos 'aposentadas' e podermos ficar tomando café com docinhos (tipo chá da tarde mesmo!) falando da preocupação com o rumo de nossos filhos e a alegria que nos dão nossos netos! rs...
Mas, enfim, não é sobre a velhice este post, mas sobre os 30 anos. E não só os meus. É que outro dia via eu fotos antigas e pensava: nossa, como estamos melhores! Falo de mim mesma, das minhas amigas, da minha irmã. Não somos mais magras, nem mais malhadas, nem temos a pele melhor (como nos incitam as propagandas, revistas e a televisão), mas somos com certeza mais belas! A Mé ousou usar batom vermelho e ficou linda! A Fê Lopes (eu!!!) assumiu os cachos enorme e as roupas só dela (chique, mas com tennis colorido) e nos surpreende cada vemos que a encontramos. A Dri, essa eu nem preciso dizer. Parece até que os olhos dela ficam cada vez mais bonitos a cada ano; será possível?! Enfim, aos 30 me encontro e encontro as mulheres à minha volta muito mais donas de si, dos seus corpos, dos seus pensamentos e das suas vontades. E isso pode querer dizer algumas celulites a mais, mas, com certeza, tbém muita personalidade extra!
E, assim, eu me compadeço com outras mulheres de 30 que conheço. Que vão ficando cada vez mais malhadas, maquiadas, na moda, mas que enfeiam a cada ano. Que não são capazes de usar batom vermelho (afinal há anos ele nao é moda!), nem de assumir seus cachos, nem de usar um tennis estranho. E, principalmente, estão cada vez mais distantes das suas vontades e do seu corpo malhado.
É em homenagem às minhas mulheres de 30 que melhoram a cada dia que vai este post.
Amo vocês, meninas!!"